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19 de abr. de 2014

Duas horas, um filme.

 Quatro ou cinco plantinhas, não lembro direito, estavam no parapeito da janela. Não sei se eram de verdade, não eram minhas, mas estavam ali ouvindo tudo que a gente falava.
Nosso papo não era sobre plantinhas: era sobre nós. Nós dois. Nós cegos.
Não dava de fazer barulho por que tinha muita gente dormindo, mas entre nós corria silenciosamente um barulho enorme. Parecia filme.
Aqueles filmes brasileiros com imagem ruim, protagonistas sofridos e roteiro super sexual. Sem ação, só diálogos que a gente vai decorando e que depois usa em um status do facebook. O cheiro da pele dele parece que invadiu o meu nariz, ficou desde aquele dia me rondando. Cheiro a pele escura. Eu gosto.
Como uma boa protagonista de um filme brasileiro, eu falei que gostava desse cheiro. Ele sorriu com aquela cara de que já sabe o que vai acontecer depois. E, realmente, acho que ele sabia.
O tempo tava carregado fazia horas, daí começou a chover e a gente começou a falar da chuva. De um jeito poético, tentando desesperadamente não deixar aquele momento passar. Eu não queria dormir, ele também não. Dormir pra quê?
Ele perguntou por que eu fugia tanto, eu respondi que não fugia. Mas eu fujo, sempre.
Entre cada diálogo, a gente se beijada como se o mundo fosse acabar, mas tinha uma energia muito ruim ali: a gente sabia que o mundo ia acabar.
Não era romance, nem paixão nem nada dessas bostas. Era o momento, o prazer de estar ali sendo íntimo no corpo, nas palavras, nas idéias.
Mas uma hora a gente tinha que dormir. Antes de cair no sono, eu senti a mão dele entrar no meu cabelo e ouvi a voz pastosa dele dizendo no meu ouvido que adorava o meu cabelo. Depois tudo virou silêncio, a última coisa que eu me lembro é a respiração no meu pescoço, quente e ritmada, de quem já está dormindo.
No outro dia, o sol varreu aquela sensação de filme brasileiro, e eu tinha que ir pra casa arrumar o quarto e colocar roupa pra lavar na máquina. Fiquei olhando a pele dele alguns segundos antes de ir embora: eu sabia que não esqueceria aquele momento, sabia também que a gente nunca daria certo.
Não daria certo. Caminhei pro sol e peguei o primeiro ônibus pra longe dele. Sentia um alivio gigante, uma leveza enorme. Filme brasileiro não é pra qualquer um e nem deve durar mais de duas horas.   

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